sexta-feira, 26 de maio de 2017

O amigo rafeiro


Toda a gente tem um amigo rafeiro. Aquele amigo que parece farejar a tua comida a quilómetros de distância e, como tal, vem a correr com a língua de fora e a baba a escorrer, à espera que lhe dês um biscoito e uma festa na cabeça.
O problema do amigo rafeiro é que te faz sentir má pessoa por pensares assim. Isto porque, qual cãozinho, está também ele disposto a partilhar tudo contigo. Seja amor ou a bola que encontrou quando estava a brincar no jardim.
Na faculdade, tínhamos o José (nome meramente ilustrativo). O José era aquele colega que nos via com uma sandes e não conseguia não pedir um bocado. E lá ia metade da sandes... Ele chegava a nossa casa (chegou a ir lá para fazer trabalhos de grupo com o meu colega de casa) e dizia logo "então o que é que tens aí que se coma?". Não me interpretem mal, eu adoro partilhar coisas, incluindo comida! Mas 1) só admito esse tipo de à-vontade quando realmente estou à-vontade com as pessoas, 2) se não estás incluído no ponto 1, espera que te ofereçam.
Livrei-me do José, encontrei o Mike (outro nome falso). O Mike foi uma das primeiras pessoas de quem gostei na residência. Tem muitas inseguranças e macaquinhos na cabeça, mas é boa pessoa. Aliás, foi o primeiro a oferecer-se para me dar comida / sumo / café / whatever. Gosta de partilhar. O que me levou, durante muito tempo, a não perceber a sua faceta de amigo rafeiro... Precisei de um "trigger" (que já vou explicar mais à frente) para abrir os olhos. E, quando abri os olhos, o que é que eu vi? Um cão esfomeado a fazer olhinhos à minha comida (não estou a brincar). De repente, apercebi-me de que ele está constantemente a fazer isto... A olhar intensamente para aquilo que estamos a comer, à espera que eu lhe pergunte se ele quer. Novamente, ele oferece coisas de volta... Mas não é bonito. É um ar de desespero que me dá vontade de não lhe dar comida, para ele aprender que não é assim que funciona (eu a querer educar um cão).
Ao fim-de-semana, eu nem me importo de lhe dar comida. Mas nos outros dias, eu cozinho sempre para duas refeições (para trazer para o laboratório no dia a seguir) e não me dá jeito nenhum que isso aconteça. Principalmente se não é planeado e eu não estava a contar com isso. Talvez ele não perceba, dado que almoça em casa praticamente todos os dias, mas para mim não é assim tão simples.
Estava eu há pouco a dizer que precisei de outra coisa para o conseguir identificar como rafeiro. Estão a ver quando os cães vão contra vocês e, como não têm noção da força, vos aleijam? O Mike vem até mim e esfrega-me os braços com força até me doer e eu fazer má cara. No outro dia, eu estava a cozinhar, e deu-me uma joelhada na perna como que a dar as boas-vindas. E foi isto que me fez lembrar o José... Eles nem fazem por mal, é só a sua forma de dizer "olá, estou aqui, sou um cãozinho, dá-me comida". É muito fofo quando cães de 4 patas os fazem, mas quando têm 2 patas só me resta mostrar má cara. E esperar que percebam, se não tenho de começar a rosnar.

1 comentário:

м disse...

Essa é demais! Amigo rafeiro nunca tinha ouvido falar :) Mas agora que penso, conheço uns assim.